CCJ aprova projeto contra ameaças reiteradas à mulher vítima de violência — Senado Notícias

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou nesta quarta-feira (12) projeto da “Lei Bárbara Penna” proibindo que condenados por violência doméstica se aproximem da casa ou do local de trabalho da vítima e de seus familiares (PL 2.083/2022). O texto também classifica como crime de tortura as ameaças e agressões no contexto domiciliar. Ele já pode seguir para a Câmara dos Deputados.
Proposto pela senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS) e com parecer favorável de Eduardo Braga (MDB-AM), o projeto traz medidas para reforçar a proteção às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar. Ele foi inspirado no caso de Bárbara Penna, de Porto Alegre (RS), que foi vítima de tentativa de feminicídio em 2013 e continuou sendo ameaçada pelo agressor mesmo depois de ele ser preso.
Segundo o texto, a Lei de Execução Penal, de 1984, passa a estabelecer como falta disciplinar grave os casos em que o condenado ou preso provisório em regime aberto ou semiaberto, ou em saída temporária, se aproxime dos locais designados. Esses condenados deverão ser submetidos ao regime disciplinar diferenciado (RDD), tipo de reclusão com regras mais rígidas, como a permanência em cela individual e limitações ao direito de visita e de saída para banho de sol.
O projeto também prevê a transferência obrigatória do preso para outras instituições penais. Braga alterou o texto para que, em caso de persistência das ameaças e agressões, a transferência do preso seja para uma unidade federativa diferente daquela em que o crime ocorreu.
Durante a leitura do seu parecer, Braga destacou que mais de 21 milhões de brasileiras — 37,5% da população feminina do país — sofreram algum tipo de agressão só nos últimos 12 meses. Os dados são de pesquisa do Datafolha, encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, e foram divulgados no início da semana.
— A Lei Maria da Penha não tem sido suficiente para que as mulheres sejam efetivamente protegidas pelo Estado brasileiro, devendo o legislador prever novas medidas protetivas. Faço aqui o devido reconhecimento e homenagem às mulheres brasileiras e do mundo inteiro, pois este é um dos crimes recorrentes na sociedade, e o número é alarmante — alertou o relator.
Na avaliação do presidente da CCJ, senador Otto Alencar (PSD-BA), o projeto vem ao encontro do sentimento de que é preciso endurecer a legislação contra “esse crime bárbaro”.
— É um projeto em sintonia com o mês de março, que é o mês da mulher, e é um projeto que reforça a proteção à mulher vítima de violência doméstica e familiar.
A senadora Margareth Buzetti (PSD-MT), autora do projeto que resultou no “Pacote Antifeminicídio” (Lei 14.994, de 2024), elogiou a proposta ao lembrar que a medida se soma a outras iniciativas importantes. Para ela, é preciso punir severamente todos os tipos de agressões antes que eles resultem em assassinato da mulher.
— Nós falhamos enquanto Estado, nós falhamos enquanto família na educação. Nós temos que punir de alguma forma. A impunidade é um convite à criminalidade. Foram os homens que nós escolhemos um dia para amar que estão matando à nós, mulheres. Isso é muito triste e vale a pena uma reflexão de nossa sociedade.
A CCJ deu a decisão terminativa sobre o projeto, o que significa que ele não precisa passar pelo Plenário do Senado antes de ir para a Câmara. Isso só acontecerá se houver recurso, assinado por pelo menos nove senadores.
Bárbara Penna
Soraya Thronicke explicou que a proposta foi inspirada no caso de Bárbara Penna, de Porto Alegre (RS). Em 2013, ela foi atacada pelo ex-companheiro, João Guatimozin Moojen Neto, que ateou fogo nela e no apartamento em que morava e a lançou pela janela do terceiro andar. Bárbara sobreviveu à tentativa de feminicídio, mas o incêndio matou seus dois filhos, ainda crianças. Moojen foi condenado a 28 anos de prisão. Mesmo depois de preso, ele continuou a ameaçar Bárbara.
— Hoje ele já obteve êxito na progressão de regime e já está fora, na “saidona”. O agressor mora na cidade dela. A vida dela é uma tortura — relatou Soraya
Em razão da repercussão do caso, o senador Sérgio Moro (União-PR) sugeriu que o projeto fosse batizado em homenagem a Bárbara Penna. A Sugestão acatada pelo relator.
— O simbolismo da pessoa que sofreu na pele esse mal que o projeto visa remediar pode chamar mais atenção — argumentou Moro.
Crime de tortura
Durante a reunião, Eduardo Braga também acatou emenda do senador Fabiano Contarato (PT-ES) para classificar como crime de tortura a submissão reiterada da mulher a “intenso sofrimento físico ou mental” no contexto de violência doméstica. Contarato explicou que, com essa alteração, pretende punir de forma efetiva o criminoso antes que seus atos evoluam para um assassinato.
— A mulher se sente revitimizada porque o crime de feminicídio não acontece só no último fato. Há todo um histórico que é banalizado, que é permeado por uma sociedade sexista e misógina. Ó agressor] hostiliza, ofende, pratica uma ameaça, pratica uma lesão corporal, para, aí sim, continuar com o objetivo nefasto que é o feminicídio.
A senadora Eliziane Gama (PSD-MA) disse que o poder público precisa efetivar uma política pública transversal de combate à violência doméstica e ao feminicídio, especialmente diante do crescente índice de violência contra à mulher mesmo diante de novas leis de prevenção e proteção.
— Nenhum marido, companheiro, namorado mata a mulher de um dia para o outro. Ele não acorda e diz: “Vou matar essa mulher hoje”. Não é assim. O processo é antecedido pela violência emocional e física reiterada.
Outras mudanças
Eduardo Braga também alterou o texto original para restringir a caracterização da falta grave do preso apenas quando existirem medidas protetivas em vigor, conforme já prevê a Lei Maria da Penha, de 2006. Segundo o relator, isso evitará punições “excessivas”.
Em outra mudança, o relator pretende deixar claro que o regime disciplinar diferenciado (RDD) será punitivo e não apenas cautelar. O RDD punitivo serve para presos que cometeram faltas graves dentro do sistema prisional, como rebeliões ou ataques a agentes penitenciários. Já o RDD cautelar é uma medida preventiva, usada quando há indícios de que o preso representa uma ameaça à segurança do presídio ou da sociedade. Ele pode ser aplicado antes mesmo de uma falta grave ser confirmada. Ambos restringem direitos do preso, como visitas e contato com outros detentos.
Pauta prioritária
Soraya Thronicke informou que apresentou um projeto de resolução para que os projetos sobre proteção da mulher e combate à violência doméstica tenham prioridade de votação no Senado (PRS 5/2025). Os projetos de resolução tratam das regras internas do Senado. Ela afirmou que “a proteção da vida não pode esperar”.
Alessandro Vieira (MDB-SE) criticou a “morosidade” do Legislativo em relação a propostas de combate à violência contra a mulher, que, segundo ele, não possuem qualquer dúvida técnica e contexto ideológico. Ele defendeu a prioridade do tema na pauta de votação do Congresso.
— Em 2019, o Senado aprovou, por iniciativa da bancada feminina, uma PEC tornando o feminicídio imprescritível e inafiançável [PEC 75/2019]. Até hoje dorme na Câmara dos Deputados. Que esse projeto não seja mais um.
A senadora Zenaide Maia (PSD-RN) falou da sua experiência como médica e plantonista em pronto-socorros da rede pública. Segundo ela, nos finais de semana essas unidades sempre recebem mulheres que foram agredidas por seus parceiros, acompanhadas, na maioria das vezes, por seus filhos. Diante da subnotificação e dos relatos recorrentes de ameaça, principalmente financeira, ela defendeu que o Congresso priorize medidas que assegurem autonomia à essa mulher.
— Elas, na grande maioria, dizem que não podem denunciar porque dependem economicamente do agressor. Por isso a subnotificação é assustadora. E nós votamos aqui e encaminhamos para a Câmara uma coisa de curto prazo, para retirar essas mulheres da dependência econômica de seus agressores.
O projeto em questão é o PL 3.595/2019, já aprovado no Senado, que reserva pelo menos 5% das vagas nas empresas que prestam serviços terceirizados ao governo federal para mulheres vítimas de violência doméstica ou em situação de vulnerabilidade social.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)